Se fizermos uma comparação rápida entre a Psicossomática e a Psicodermatologia, a primeira é um campo de estudo, sem dúvida, mais conhecido e comentado.

Ao longo dos últimos anos, uma nova concepção de ser humano tem ganhado espaço no campo da Medicina. O ser humano, antes fragmentado pelo paradigma cartesiano-newtoniano, passou a ser visto e estudado como um ser cujos supostos fragmentos atuam em conjunto e precisam ser analisados de forma integrada (Azambuja, 2000).

A psicossomática adotou esta concepção e tornou-se um campo da Medicina que trabalha com a visão integrada de ser humano. No início do século XIX, o termo ‘psicossomática’ foi usado pela primeira vez, pelo psiquiatra alemão Heinroth (Silva & Müller, 2007). A princípio, foi usado para referir-se a doenças cujas correlações entre o estado psicológico e a condição clínica do organismo eram bastante perceptíveis. Entretanto, à medida que estudos e observações eram realizados com portadores de diversas enfermidades, percebeu-se que o termo era válido para toda e qualquer doença (Mello Filho, 2002). Começou-se, então, a estudar as relações entre quadros clínicos médicos e tipos de personalidade, utilizando a teoria psicanalítica. A partir desses estudos surgiu a Medicina Psicossomática (Azambuja, 2000).

A perspectiva psicossomática promoveu mudança nas pesquisas clínicas que passaram a estudar a especificidade psicológica das doenças orgânicas. De acordo com Holden (1980), devido a diferenças teóricas, houve uma cisão no campo da Medicina Psicossomática entre aqueles que tinham orientação psicanalítica e os que adotavam a psicobiológica. Os que adotaram esta última abordagem separaram-se dos demais e formaram um novo campo que veio a se chamar Medicina Comportamental.

Assim, no final da década de 1970, surgiu a Medicina Comportamental, tendo como precursora mais direta a Medicina Psicossomática. Oficializou-se como novo campo de estudo em uma conferência realizada na Universidade de Yale em 1977 (Holden, 1980). Este novo campo se propôs a integrar os conhecimentos e técnicas da Análise do Comportamento e das ciências biomédicas, com o intuito de compreender a saúde e a doença e aplicar estes conhecimentos e técnicas na prevenção, diagnóstico, tratamento e reabilitação (Holden, 1980; Kerbauy, 2002).

De acordo com Holden (1980), a Medicina Comportamental pode atuar tanto em problemas relacionados ao stress e outros fatores psicossociais como em doenças cuja causa é claramente externa (como as bacterianas). Assim como a Medicina Psicossomática, a Medicina Comportamental trabalha com a noção integrada de ser humano, na qual as condições psicológicas públicas (ações motoras e seus produtos, por exemplo, a fala) e privadas (pensar e sentir) são partes do funcionamento do organismo.

Diversas pesquisas realizadas para analisar o efeito que as condições psicológicas exercem sobre as condições corporais possibilitaram o surgimento de outro campo de pesquisa, na década de 1970, denominado Psiconeuroimunologia (PNI). Aplicando o conceito integrativo ao ser humano, a PNI dedica-se ao estudo das relações entre sistemas fisiológicos (em especial, o nervoso, o endócrino e o imunológico), aspectos psicológicos e órgãos do corpo (Azambuja, 2000).

A hipótese base da PNI é que os estressores sociais diminuem a eficiência do sistema imunológico levando ao aumento do risco de doenças (Maia, 2002). Estudos em PNI sobre as relações entre o estresse psicossocial e o desenvolvimento de doenças de pele deram sustentação científica às suposições de relação entre fatores psicológicos e doenças dermatológicas (Azambuja, 2000).

Na década de 1980, os estudos da relação entre emoções e pele se intensificaram e o campo de pesquisa denominado Psicodermatologia se desenvolveu. Atualmente este campo científico integra estudos da área da Medicina e da Psicologia, com o objetivo de melhor entender as doenças de pele (Hoffmann, Zogbi, Fleck, & Müller, 2005; Ludwig et al., 2008a; Papadopoulos, 2005) e tratar o paciente dermatológico como um ser integral (Dias, 2005).

Psicodermatologia foi um dos campos de estudo em que realizei minha pesquisa de mestrado. Você pode ler a dissertação completa aqui.


Referências:
Azambuja, D. R. (2000). Dermatologia integrativa: a pele em novo contexto. Anais Brasileiros de Dermatologia, 75(4), 393 – 420.
Dias, M. B. (2005). Vitiligo como sintoma. A dificuldade no contato com as emoções. Pulsional. Revista de Psicanálise, 18, 34 – 40.
Hoffmann, F. S., Zogbi, H., Fleck, P., & Müller, M. C. (2005). A integração mente e corpo em psicodermatologia. Psicologia: Teoria e Prática, 7, 51-60.
Holden, C. (1980). Behavioral medicine: an emergent field. Science, 209(4455), 479-481.
Kerbauy, R. R. (2002). Comportamento e saúde: doenças e desafios. Psicologia USP, 13, 11-28.
Ludwig, M. W. B.,  Muller, M. C., Redivo, L. B., Calvetti, P. U., Silva, L. M., Hauber, L. S., & Facchin, T. H. J. (2008a). Psicodermatologia e as intervenções do psicólogo da saúde. Mudanças – Psicologia da Saúde, 16, 37–42.
Maia, A. C. (2002). Emoções e sistema imunológico: um olhar sobre a psiconeuroimunologia. Psicologia: teoria, investigação e prática, 2, 207-225.
Mello Filho, J. (2002). Concepção psicossomática: visão atual (10a ed.). São Paulo: Casa do Psicólogo.
Papadopoulos, L. (2005). Psychological therapies for dermatological problems. In C. Walker & L. Papadopoulos (Eds.), Psychodermatology: the psychological impact of skin disorders, (pp. 101-115). New York: Cambridge University Press.
Silva, J. D.T. & Müller, M. C. (2007).Uma integração teórica entre psicossomática, stress e doenças crônicas de pele. Estudos de Psicologia, 24(2), 247-256.